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É dia de refletir sobre a Equidade de Gênero na Economia Solidária
A atual conjuntura econômica, social e polÃtica do Brasil nos apresenta um cenário onde podemos observar que o desemprego da população é crescente, há um aumento da concentração de renda, desigualdade e exclusão social, desdobramentos inerentes ao modelo e à s relações impostas pelo modelo capitalista. Em contrapartida, emergem a necessidade de processos e movimentos de construção e desconstrução do modelo econômico e social vigente, alternativas para assegurar trabalho e renda ameaçados (ou inexistentes), e também se soma a ela, a preocupação de favorecer uma distribuição equitativa de direitos e da riqueza produzida no paÃs.
Assim, surge a Economia Solidária, que traz para si a tarefa da construção de uma outra forma de economia baseada na cooperação, na democracia, na justiça social, na autogestão, na participação equitativa, na produção coletiva e nas relações de produção e consumo consciente e solidário, que apontariam para uma outra sociabilidade, para uma sociedade preocupada com um desenvolvimento sustentável em vários âmbitos.
Nessa construção, estão postos inúmeros desafios cotidianos que têm que ser enfrentados e absorvidos, dentre eles, faz-se necessário o entendimento das demandas originadas e do amplo sistema de opressão que sofremos e reproduzimos, sem normalmente notar como nossos pensamentos e ações colaboram na manutenção dessas relações de subordinação, seja ela por raça, classe social, religião, orientação sexual, identidade de gênero, etnia, idade e gênero.
A reflexão e associação de pautas diversas vem aproximando cada vez mais a Economia Solidária de diversos Movimentos Sociais, procurando diálogo, quebra de paradigmas e apoio ao protagonismo dessas populações, que antes ficavam à margem dentro dos processos de opressões.
Por exemplo, uma parte significativa da juventude brasileira apresenta grandes dificuldades em conseguir inserção no mercado de trabalho. Para analisar as atuais taxas de desemprego, é importante considerar que as oportunidades não são iguais para homens e mulheres e as desigualdades de gênero são ainda mais graves quando ocorre sobreposição com outras condições desprovidas de privilégios vigentes, visão possÃvel através da lente da interseccionalidade, conceito proposto pelo Movimento Feminista.
A participação das mulheres no mundo do trabalho é bastante considerável, porém esta não se traduz em melhoria de sua qualidade de vida, nem em respeito aos seus direitos. Na Economia Solidária, os jovens e as mulheres têm um campo fecundo para o enfrentamento da exclusão e do trabalho precarizado e alienado, para a possibilidade de rompimento da lógica da divisão sexual do trabalho, do machismo, da exploração e da dominação de gênero.
É importante compreendermos que as manifestações e relações de uma sociedade refletem a maneira como o poder, mesmo que invisÃvel, está organizado e tem como dado nela. No mundo androcêntrico, onde as experiências masculinas são consideradas como as experiências de todos os seres humanos e tidas como uma norma universal, lugar das mulheres é previsto como secundário, seja pela falta de protagonismo imposto ou pela falsa representação das mulheres em sua diversidade.
A cultura predominante retrata as mulheres como objeto de consumo e desejo dos homens, desconsiderando seu papel enquanto individuas com planos e vontades próprias. Nesse lugar de objetificação, há uma idealização de mulher que é mais valorizado: branca, cisgênera, magra e com os cabelos lisos. Esse padrão expressa uma série de preconceitos, já estruturais, persistente em nossa sociedade. Com heranças da nossa colonização, essa cultura predominante submete as mulheres negras à papéis ainda mais coadjuvantes e estereotipados. As poucas atrizes negras de grandes emissoras de televisão continuam com pouco espaço, e quando os tem, em sua maioria é para representar papéis de empregadas domésticas ou escravas em novelas de época. Às mulheres indÃgenas, estereotipadas na representação da nativa vista no ano de 1500, cabe uma descontextualização de suas vivências.
Além disso, também são poucas as representações de mulheres cujas existências, prioridades e afetividades não girem em torno da idealização de relacionamentos românticos e heterossexuais. Podemos observar isso na música, na literatura, no teatro, no cinema, na televisão e nas redes sociais, e perceber que vivemos em uma sociedade heteronormativa, que exerce poder de controle e organização nas vidas e sexualidades das mulheres e desqualifica as mulheres com outras orientações sexuais. Para mudar isso, precisamos dar um primeiro passo que é dar espaço para as pautas das mulheres L(G)BT e dar visibilidade para as mulheres transgêneras, que sofrem ainda mais opressões que as mulheres cisgêneras.
Vale a lembrança, que neste perÃodo de desconstrução e construção de novos papéis, as mulheres não estão à procura de igualdade, que ignora suas especificidades e trata homens e mulheres como se fossem iguais, e sim por equidade de direitos, onde as individualidades são respeitadas e há uma distribuição de direitos mais justa.
Cabe às mulheres, principalmente jovens, o papel de levantar suas pautas, serem protagonistas de suas histórias e construir em direção à priorização do diálogo em direção a ruptura de padrões sociais dominantes. Contamos com o apoio dos homens para que esta construção seja plena e absorvida pela cultura, respeitando a fala e o protagonismo das mulheres.
É nÃtido que é preciso romper essa lógica, mantendo um espaço de diálogo ativo e constante para podermos refletir e construir de fato uma Economia Solidária onde a equidade de gênero prevaleça.
* Natália Toledo, designer, formada pela UNESP, em Bauru/SP, e educadora social. Sócia do empreendimento Ideário – Rede Design PossÃvel, Diretora Financeira da Associação S2 Selo Social e integrante do Coletivo Lumika.