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30% dos jovens dormem menos que o recomendado
Filipe de Abreu, de 16 anos, fica no computador até tarde; estudo mostra que jovens com TV ou computador no quarto dormem menos
“De ontem para hoje, não dormi”, conta o estudante Filipe de Abreu, de 16 anos. Assim como mais da metade dos adolescentes brasileiros, Filipe dorme menos de oito horas por noite. “Normalmente fico no computador só até meia-noite, mas quando tenho trabalho de escola para entregar, vou até mais tarde”, conta. Na manhã seguinte, o despertador toca implacavelmente à s 6 horas. O jeito é levantar.
A situação não é muito melhor entre as crianças de 4 a 12 anos. Segundo dados do Projeto Atenção Brasil, cerca de 30% dormem menos que o recomendado para a idade. A pesquisa, realizada pelo Instituto Glia, ouviu pais de quase 6 mil jovens entre 4 e 19 anos em 17 Estados.
As causas da falta de sono não foram investigadas, mas especialistas ouvidos pelo Estado são unânimes em apontar o mau hábito como culpado. “Não tenho dúvida de que isso é reflexo da permissividade dos pais em relação aos hábitos de sono e ao acesso à s mÃdia eletrônicas”, afirma o neurologista infantil Marco Antonio Arruda, diretor do Instituto Glia.
O estudo também apontou que os jovens que dormem mais de oito horas por noite têm o dobro de chance de ter bom desempenho escolar e bons Ãndices de saúde mental. Arruda explica que o conceito de saúde mental adotado vai além de não ter uma doença. “É um estado de bem-estar, no qual a pessoa está apta a superar as dificuldades da vida, estudar e trabalhar de forma produtiva.”
Pesquisas epidemiológicas em todo o mundo mostram que as crianças estão dormindo menos do que deveriam. O problema piora na adolescência, quando ocorre um atraso natural no relógio biológico. O impacto das alterações hormonais na rotina de sono vai depender do estilo de vida de cada famÃlia, diz a neuropediatra Márcia Pradella, do Instituto do Sono da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). “Para uma criança que ia dormir à s 21 horas, é aceitável que passe a dormir à s 22 ou 23 horas. Mas se ela estava acostumada a dormir tarde e passa a dormir mais tarde, acordar para ir à escola vira um problema.”
Consequências. A dona de casa Edilma de Abreu, mãe de Filipe, conta que desde de bebê ele “gosta de dormir tarde”.”Sempre falo para ele que isso não é bom para a saúde, mas ele não me ouve”, diz.
Dona Edilma está certa. A falta de sono diminui a imunidade, prejudica a memória, a capacidade de concentração e pode até deixar as crianças agitadas, levando a um quadro que pode ser confundido com Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH). Quando a privação se torna crônica, podem ocorrer alterações no metabolismo e atraso no crescimento.
É durante a adolescência que o corpo passa pelo maior estirão de crescimento. Essa é, portanto, a fase em que o hormônio do crescimento – liberado durante o sono – se faz mais necessário. “Antes se pensava que dormir oito horas por noite seria suficiente, mas pesquisas recentes mostraram que o tempo ideal para um adolescente é, em média, nove horas e meia”, conta Márcia.
O desejo próprio da idade de protelar o sono é alimentado pelo acesso irrestrito à mÃdias eletrônicas. Estudo publicado na revista Sleep mostrou que jovens com TV ou computador no quarto vão dormir significativamente mais tarde e apresentam maior Ãndice de fadiga.
“A privação de sono entre os estudantes está se tornando um problema tão sério que algumas escolas americanas, que funcionam em perÃodo integral, estudam adotar a sesta após o almoço”, conta a especialista em Medicina do Sono Magda Nunes, da PUC do Rio Grande do Sul.
A estratégia pode ser útil. Tirar uma soneca à tarde – curta, para não atrapalhar o sono noturno – ajuda a tirar o atraso. Esticar na cama nos fins de semana, também. Mas quanto mais tarde o adolescente vai dormir durante a semana, mais difÃcil repor o déficit. Além disso, a maioria dos jovens hoje têm a rotina tão atribulada que raramente podem se dar ao luxo de tirar um cochilo. Murilo Lopes, de 18 anos, acorda à s 5h30 para ir ao cursinho, passa as tardes estudando e, nos dias em que tem aula de inglês à noite, chega em casa à s 23 horas: “E no sábado de manhã tenho simulado no cursinho.”
Como a queda nas horas de sono costuma ser acompanhada pela queda no rendimento intelectual, tanta correria pode acabar não compensando, alertam os especialistas.